Apesar de ser tema antigo no Poder Judiciário, com decisões favoráveis aos contribuintes, os fiscos estaduais insistem em tributar com o ICMS as transferências de mercadorias entre filiais. A intenção deste artigo é alertar os empresários para a ilegalidade dessa exação.
Em 2020 o assunto foi pacificado pelo Supremo Tribunal Federal ao julgar, em repercussão geral, o Tema 1099, firmando-se a seguinte tese: “Não incide ICMS no deslocamento de bens de um estabelecimento para outro do mesmo contribuinte localizados em estados distintos, visto não haver a transferência da titularidade ou a realização de ato de mercancia.”.
O respectivo acórdão foi ementado assim:
Recurso extraordinário com agravo. Direito Tributário. Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Deslocamento de mercadorias. Estabelecimentos de mesma titularidade localizados em unidades federadas distintas. Ausência de transferência de propriedade ou ato mercantil. Circulação jurídica de mercadoria. Existência de matéria constitucional e de repercussão geral. Reafirmação da jurisprudência da Corte sobre o tema. Agravo provido para conhecer em parte do recurso extraordinário e, na parte conhecida, dar-lhe provimento de modo a conceder a segurança. Firmada a seguinte tese de repercussão geral: Não incide ICMS no deslocamento de bens de um estabelecimento para outro do mesmo contribuinte localizados em estados distintos, visto não haver a transferência da titularidade ou a realização de ato de mercancia. (ARE 1255885 – STF)
Mesmo assim, é comum haver a tributação sob a justificativa de que o fato gerador do ICMS não seria a transferência de titularidade da mercadoria (que é a tese, vencedora, dos contribuintes), mas a simples circulação.
O Superior Tribunal de Justiça possui súmula com o mesmo entendimento: “Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte” (Súmula 166).
E os tribunais estaduais de justiça seguem também em favor dos contribuintes:
APELAÇÃO – MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO DE LIMINAR – ICMS – DESLOCAMENTO DE PRODUTOS ENTRE FILIAIS – Preliminar: suposta necessidade de suspensão do processo, ante a pendência de julgamento dos embargos de declaração opostos na Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 49 – descabimento – ausência de concessão de efeito suspensivo aos mesmos. Mérito: pretensão mandamental voltada à concessão de ordem no sentido de reconhecer o direito da autora de realizar transferências de mercadorias entre sua matriz e filiais independentemente do recolhimento do ICMS correspondente a tais operações – admissibilidade – não caracteriza a hipótese de incidência do ICMS o simples deslocamento da mercadoria (sem a transferência de propriedade) de um estabelecimento para outro da mesma empresa, ainda que se trate de circulação interestadual de mercadoria – inteligência da Súmula nº 166 do C. STJ e de julgado do E. STF em sede de repercussão geral (Tema nº 1.099) – declaração de inconstitucionalidade dos artigos 11, §3º, II, 12, I, no trecho “ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular”, e 13, §4º, da Lei Complementar Federal nº 87/96, no julgamento da ADC nº 49 pelo E. STF – direito líquido e certo ora reconhecido – Precedentes do STJ e do STF – Sentença concessiva da ordem de segurança mantida – Recursos, oficial e voluntário da FESP, desprovidos. (TJSP; Apelação / Remessa Necessária 1073259-17.2021.8.26.0053; Relator (a): Paulo Barcellos Gatti; Órgão Julgador: 4ª Câmara de Direito Público; Foro Central – Fazenda Pública/Acidentes – 13ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 27/02/2023; Data de Registro: 03/03/2023)
Vale registrar que para os produtos sujeitos ao regime da substituição tributária, também não deve haver a incidência do ICMS-ST nas transferências de mercadorias entre filiais, contudo, existe alguma divergência na justiça quanto a isso. Porém, as possibilidades de êxito em favor do contribuinte também nesse caso de ICMS-ST interestadual são relevantes:
Agravo de Instrumento. Mandado de Segurança preventivo. ICMS. Regime de substituição tributária. Transferência de mercadorias entre estabelecimentos da mesma contribuinte. Decisão que deferiu liminar para determinar que a autoridade impetrada abstenha-se de exigir o destaque do ICMS na transferência, mesmo interestadual, entre matriz e filiais. Recurso da Fazenda do Estado. Inviabilidade Ausência de circulação jurídica de mercadoria, não ocorrendo, portanto, o fato gerador do ICMS. Precedentes do STJ e desta Corte. Súmula n. 166 do STJ. Recurso improvido. (TJSP; Agravo de Instrumento 2126227-11.2017.8.26.0000; Relator (a): Aroldo Viotti; Órgão Julgador: 11ª Câmara de Direito Público; Foro de São José do Rio Preto – 1ª Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 14/12/2017; Data de Registro: 14/12/2017)
Dessa forma, independente de a empresa apurar sua contabilidade pelo lucro real ou presumido, quando realizar a transferência de mercadorias entre suas filiais, ainda que em Estados diferentes e submetidas a substituição tributária, é possível afastar a incidência do ICMS, bem como a restituição dos valores eventualmente pagos nos últimos cinco anos.